quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Quando os homens falam de amor #47







cromices #64: Vou manter a tradição pela metade.



Refiro-me, é claro, ao dia de hoje: o último dia do ano, o reveillon.

Comecei uma dieta especial há anos: a de cortar com as promessas, e isso inclui, especialmente, as tradicionais resoluções de ano novo.

Não sou boa com promessas. Acho que quando começamos uma frase com "havemos de" já é meio caminho andado para algo ficar, na melhor da hipóteses, pela metade. Pelo dito e não feito.
Porque se é algo que queremos mesmo fazer, fazemos e ponto.
Talvez não no momento imediato, porque a vida, infelizmente, não se rege só de vontades. Mas, haver vontade é iniciar o trilho para a realização de algo, não ficar apenas pelas frases soltas.

Também eu, no passado, me dedicava neste dia do ano a reflectir sobre as tais resoluções, o que faria de diferente no novo ano, a elaborar a lista de acções, grandes e pequenas, mais ou menos mundanas, que fariam de mim, na teoria, uma "melhor" pessoa.

No entanto, nunca deixei de fumar, nem nunca me cheguei a inscrever num ginásio ou qualquer actividade desportiva, deixei de ter mau feitio ou atingi outro qualquer objectivo por efeito de uma dessas listas.
Pelo contrário. Concluí que esta tradição é um subproduto de uma qualquer parte do nosso cérebro que se dedica à culpa. É um exercício onde nos apontamos o dedo, debruçamo-nos sobre os aspectos mais negativos da nossa personalidade, as coisas que lá por dentro achamos que ficaram por fazer, por cumprir, em que errámos. Pois, se assumimos nesse instante querer fazer mais e melhor, de certa forma, estamos a considerar que não foi feito o suficiente e bem.

A evolução pessoal é desejada e necessária. Digo o mesmo quanto à reflexão sobre a própria natureza e as consequências dos próprios actos, mas considero-a mais benigna se feita em pequenas doses, ao longo do ano. Não há pastilha para a azia que resolva tal enfartamento se se guarda o festim para um único dia.

E, se é dia para se celebrar, para "entrar com o pé direito", abraçar o conceito de mais um ano de vida, (embora o nosso conceito de tempo seja apenas uma percepção partilhada, a vida é um óptimo motivo para se celebrar), para quê e como fazê-lo devidamente após uma sessão de auto-culpabização?!

A única tradição que mantenho é a minha transmissão de votos: desejo-vos (nos) um Bom Ano!
Que cada ano novo seja em tudo melhor que aquele que finda, para todos nós! De coração. Sem promessas.
Até para o ano!




domingo, 28 de dezembro de 2014

Vida de cão #9: Dizem que dá sorte.



O Kiko é esperto que nem um alho, disso não há dúvidas. Teimosia também não lhe falta, tanta ou mais que a esperteza.

Em relação às necessidades fisiológicas estamos, de certa forma, a perder a guerra. Estamos a ser vencidos pelo cansaço. A agarrarmo-nos à ideia que quando finalmente for possível levá-lo à rua, (já faltou mais!), poderemos começar um novo capítulo, em que finalmente andaremos por casa sem a necessidade de ligar todas as luzes e olhar atentamente para o chão a cada passo.

Sobre esta necessidade ontem aprendi uma lição valiosa.

Já é hábito, (especialmente agora que faz frio e sentimos na pele o apelo da letargia e da hibernação), instalarmo-nos os três no sofá depois do jantar a ver uma coisa qualquer no aconhego da mantas.
Também é hábito volta e meia adormecermos.

Ontem quando acordei de uma dessas providenciais sestas em família dirigi-me ao wc. Pelo caminho passei pelo escritório. Esqueci-me que umas horas antes tinhamos fechado a porta da sala, impedindo o Kiko de entrar por um bocado como castigo, e que haveria consequências desse time out algures.
Entrei pelo escritório na penumbra, apenas iluminada pela luz que vinha do corredor. Era suficiente para o que tinha de fazer.
Senti algo debaixo dos pés. Estava ensonada, e por momentos julguei que tivesse pisado um dos cinquenta brinquedos de Sua Excelência. Continuei a andar. Um, dois, três passos até o meu cérebro achar que aquela consistência não parecia nada a de um brinquedo.
Pois é. Pisei uma mega poia, sujei a sola dos chinelos e andava, no breu, a deixar pegadas no soalho.

Só vos digo, é um petisco do caraças andar a meio da noite a lavar chinelos e chão.

Faz parte. Dizem que dá sorte. Pelo tamanho da coisa é bom que não me esqueça de jogar no próximo Euromilhões. É que pisei a bosta com ambos os pés, aposto que agora nada me impedirá de me tornar milionária.


quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

A quem está desse lado



Creio já ser uma boa altura para vos deixar aqui os meus votos natalícios, ainda que de forma singela.
  Este ano recorro aos clichés. Há clichés que apenas se tornam em tal porque possuem uma essência de verdade e constância.
Sem mais delongas, Amor, Saúde e Prosperidade, são os três desejos que vos envio, como se fossem os "meus" reis magos a caminho do vosso Presépio - lar, família e coração.
Acredito que havendo estes três pilares, nada faltará na Vida. Que assim seja. No Natal e em todos os dias.




segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Vida de cão #8: das gracinhas que enchem o coração



Sentamo-nos no chão com a pernas cruzadas.

Atiramos a bola.

O kiko corre. Com velocidade e destreza apanha-a. Corre na nossa direcção, de bola na boca. Lança-se no ar para aterrar no nosso colo.

Ajeitamos-lhe a postura. Ele ali fica, enroscado, a mordiscar a bola e a fazer barulhinhos de satisfação.

O melhor de tudo é perceber que não é a bola nem o elogio a recompensa. Somos nós.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Cromices #64: Este poderia ser um post sobre moda...



Facto #1: Sou friorenta.

Facto #2: Gosto de roupa desportiva, acima de tudo confortável, tipo o que se encontra na secção de caminhadas da Decathlon.

Facto #3: Estou-me cagando para modas. Mais que defeito é feitio.


Como é que as pessoas reagem ao meu sentido fashionista?

- "Ai tão gira! Parece que vem da neve!" - isto digo pela senhora da esplanada da praia onde fomos tomar o pequeno-almoço.

E é isto.


caixa de ressonância







cromices #63: a bela música que vem dos canos!



Somos uns privilegiados: quando queremos água é só abrir a torneira.

E o gesto é tão reflexo, automático, que aposto que é coisa rara qualquer um de nós pensar no quão somos realmente uns privilegiados por isso.

Até ao momento em que falta a água, como hoje. Momentos que volta e meia têm que acontecer porque existem contratempos, manutenção que tem que ser feita, mas que nos apanham sempre de surpresa.

E dou por mim a maldizer a louça por lavar, a aguentar sem ir ao wc até ao inevitável momento em que parece que a bexiga vai rebentar, a fazer render a água que ainda existe no autoclismo, a lavar as mãos naquele fiozinho de água tão estreito que por sorte ainda escorre da torneira.

Até que de repente se ouve uma sinfonia nos canos, sinal que a água voltou. É uma melodia desarmónica, mas soa tão bem!

Vida de cão #7: o acessório mágico



Sabem aqueles sopradores que servem, lá está, para soprar quaisquer impurezas ou partículas das lentes das máquinas fotográficas?

Acreditem ou não é um acessório extremamente útil nisto do treino canino.

Dizem que quando os cães estão a ter um daqueles momentos muito chatos, em que não entendem um "não", (por exemplo se exercem demasiada força com os dentes na interacção com os humanos ou outros momentos similares), uma das técnicas aconselhadas é borrifá-los com um spray ligeiro de água no focinho.
Mas, como não queremos que ele ganhe aversão à água, (gostar de banho é fundamental), encontrámos neste acessório de fotografia a resposta.

Ainda agora mesmo, depois de uma boa sessão de brincadeira para lhe dar atenção e gastar energias, o Kiko não estava a querer compreender que tinha chegado o momento de acalmar, o que também é uma lição importante.  Então sentei-me aqui, à secretária, e lá estava ele a tentar subir-me pelas pernas, (que unhas, senhores!).
Como o "não" não estava a fazer efeito, fui buscar o soprador. Duas borrifadelas de ar foram suficientes.

Acalmou e foi para a cama fazer uma sesta. Daqui a um bocado vou recompensá-lo por ter entendido e respondido da melhor forma com ração e mais uns mimos.

O ar é obviamente inofensivo, não o magoa de forma alguma, e nem sequer o assusta. Esta deve ter sido a segunda ou terceira vez que utilizei o borrifador no Kiko, mas recomendo. Bate aos pontos, pela eficiência e grau de humanidade, outras técnicas como elevar o tom de voz, (o que é fácil de acontecer quando nós humanos começamos a ficar frustrados), e especialmente as palmadas por mais suaves que sejam.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

cromices #62: Garanto que tinha sucesso!



Espanta-me que a internet traga soluções para tudo. Existem sites e app's especializadas em tudo e mais um alho, algoritmos mágicos para encontrar o tal emprego, a cara metade, o alojamento perfeito para as férias, a peça de roupa ou o corte de cabelo que assentam mesmo bem, etc.

Espanta-me ainda mais que não tenham pensado em aplicar esta alquimia algorítmica ao universo dos condomínios e vizinhança. É que tinha futuro e ainda se habilitavam a serem nomeados para o Nobel da Paz.

Ora tenham a gentileza de acompanhar este meu raciocínio:

Uma pessoa compra ou aluga uma casa e, em termos de vizinhos, não sabe ao que vai. E isso é receita garantida para que a coisa corra mal, asseguro-vos eu.
Sublinho que em tudo se aplica a lei da reciprocidade, também quem já lá estava não sabe quem lá vem.

É claro que "mal" é um conceito demasiado vago, há todo um degradé da coisa, que vai do "mal que mal se nota", o grau 1,  ao "inferno na terra", o grau 10 (vamos manter as coisas simples).

Eu diria que me encontro, conforme os dias, numa variação entre o grau 2 - "mal menor" e, vá lá o sexto nível, que já causa arritmias ligeiras e cabelos brancos, o que dá uma média aceitável, ao nível do Cândido de Voltaire, em que ainda nos vamos conseguindo convencer que, se olharmos para a floresta e não focarmos nas árvores, somos uns sortudos. Que poderia ser bem pior, e que "vivemos no melhor dos mundos possíveis".

Basicamente são mecanismos do cérebro humano que nos fazem crer nessa linha prateada em todas as coisas. Uma espécie de ferramenta biológica para a adaptação e a sobrevivência, que impede que caiamos que nem tordos de ataque cardíaco fulminante ao mínimo contratempo.

Ora se alguém se desse ao trabalho de desenvolver o tal site ou aplicação, a coisa seria bem melhor, acredito.

Imaginem a cena: Agente imobiliário acompanha casal a visitar um apartamento. Durante a visita, falam-se não só de tipologias, acabamentos e preços mas também do perfil da vizinhança.

- Olhe, o tipo de pessoas que aqui vivem são moderamente anais, têm um elevado grau de responsabilidade, logo pagam o condomínio a tempo e horas, (saca do powerpoint com gráficos sobre pagamentos de condomínio e presenças em reuniões referentes a cada fracção). A média do grupo em termos de quociente de inteligência emocional é bastante razoável. Poderia ser mais elevada não fossem as tendências passivo-agressivas do vizinho do apartamento X, e o gosto pela cusquice do casal do Y.
É um grupo que prefere actividades diurnas, logo não se esperam farras pela noite dentro. Quando questionados sob polígrafo, não há ninguém que use saltos altos em casa, que atire beatas pela janela ou pendure a roupa a pingar.

Ah, vejo aqui as suas indicações... Estejam descansados, segundo o grupo de perguntas sobre gostos pessoais ninguém escolheu música pimba. Se vos acordarem é mais provável que seja ao som de Foo Fighters ou Mozart do que de Dino Meira ou algum dos Carreira. E gostam de animais.




sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Vida de cão #6: uma simples caixa de cartão



O nosso lema tem sido "uma no cravo, outra na ferradura".

É importante indicar ao Kiko que não deve roer sapatos, nem roubar meias, nem arranhar isto ou aquilo, sobre quando pode e não pode subir para o sofá ou para a nossa cama. Enfim, tem sido bombardeado com uma série de regras...
A verdade é que criatura alguma neste mundo, inclusive nós e especialmente um bicho que ainda nem tem três meses de idade, aguenta um mundo só de regras e "nãos".

Para o compensar e fomentar uma espécie de equilíbrio tivemos que lhe arranjar algo que ele pudesse arranhar, destruir, o diabo a quatro.

A solução foi uma caixa de cartão, daquelas usadas nas mudanças, que comprámos no Leroy por tuta e meia.

O marido montou-a. Recortou-lhe uma entrada, e fez daquilo uma espécie de toca. Ele entra, arranha-a, arranca-lhe pedaços, espalha cartão por toda a divisão e está tudo bem. É para isso que inventaram um artefacto chamado vassoura.
Quanto esta precisar de reforma, temos outra de reserva.




quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Ode às relações falhadas



Quando penso nestas coisas do Amor, chego à conclusão que o Destino foi bem mais generoso e célere comigo do que alguma vez esperei.

Aliás, se me tivessem dito, jurado a pés juntos até, que iria conhecer a "tampa do meu tacho" quase no início da minha vida adulta, teria agido qual descrente, assumiria que estaria diante de alguém incrivelmente tolo.

Acho que em miúda tinha uma visão muito própria destas coisas amorosas. Lembro-me de ter lido, ainda bastante nova, vários clássicos como "Romeu e Julieta" e de concordar com Frei Lourenço, naquilo do amor dos jovens estar nos olhos e não no coração.

Embora acreditasse, ou melhor, quisesse acreditar no conceito de almas gémeas, amor eterno com todos os requintes românticos, a minha teoria era que, enquanto jovens, não estamos aptos para nada além de relações transitórias, experiências passageiras, sem grandes contornos de compromisso.
Que se ainda somos uma obra em construção, de barro mole, de matéria volátil ainda a descobrir a sua forma, entrar numa relação de cabeça, a pensar que é para sempre seria algo tremendamente irracional.

Depois fui arrebatada tão mais cedo do que antevia, e ainda bem. E só tenho a agradecer a quem nos bastidores do universo tenha puxado os cordelinhos para isso acontecer, mesmo que se tenha apressado para dar uma grande lição a uma miúda demasiado segura de si, das suas opiniões e certezas e dar uma boa gargalhada à minha custa. Acredito num Deus com sentido de humor.
Continuo sem feitio para coisas muito lamechas, mas tornei-me uma crente nesta coisa do Amor.

Não vos conto estas minhas coisas para esfregar em cara alheia a minha felicidade. O objectivo é precisamente o contrário: dar-vos esperança se esta vos falta, garantir-vos que há uma certa ordem cósmica que se disfarça de caos, assegurar-vos que tudo vai ficar bem se vos falha essa certeza.


Mesmo enquanto miúda, com as minhas teorias mirabulantes, a falta de experiência e maturidade próprios da idade, os instintos certos estavam presentes.

Já naquela altura eu olhava para todas as relações sem futuro como oportunidades de aprendizagem.

Hoje, quase nunca penso no passado, mas quando o faço é com gratidão. Não existem relações falhadas, existem relações que nos preparam para a certa, que nos ajudam a ter algumas certezas sobre quem somos e o que procuramos no próximo, as características que desejamos e aquelas que já sabemos serem incompatíveis.

caixa de ressonância







coisas de ver #52


The Librarians






quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

coisas de ver #51


Ao ver isto é impossível não gostar de casas na árvore, e até ficar a suspirar por uma!

Treehouse Masters






cromices #61: O Santinho Padroeiro dos Descuidos ou a evolução natural das coisas



Há dois tipos de filhos: os planeados e os frutos do descuido.
Entre as pessoas que conheço, gentes das minhas relações, mais ou menos próximas, há tanto de uns como de outros, igualmente amados e bem cuidados.

Durante a nossa vida em comum já fomos questionados sobre isto de ter filhos milhares de vezes. Como em tudo, a prática leva à perfeição e já tenho uma resposta pronta que debito de forma automática, que é mais ou menos assim:
"Não temos filhos, nem estamos a considerar ter. Nunca se diz nunca. Talvez um dia mudemos de ideias. Para já, só se fosse por acidente. Mas se isso acontecesse, claro que lhe íamos dar o melhor de nós. Mas, por enquanto, está completamente fora de questão."

E dou por encerrada a questão. Ponto final parágrafo. Muda de assunto.

Os nossos pais estão mortinhos por ser avós.

Havia uma época em que todas as vezes que nos víamos era "vira o disco, e toca o mesmo" com o discurso de quando é que vem um netinho, ai que queríamos tanto um netinho, ou uma netinha. Chegava o Natal, e com este, o discurso festivo de que só faltava o menino Jesus.

A coisa chegou a ser massacrante, e quando a paciência se esgotou meti um travão na coisa. Finquei pé e disse que já chegava daquilo, que davam cabo da paciência a um morto. Que quanto mais cedo aprendessem a lidar com o facto melhor e que mudassem de assunto, que aquele já enjoava. Que "desculpem lá", mas já não podia ouvir falar da mesma coisa, e que o único resultado possível da estratégia de tentar vencer pelo cansaço seria exatamente o oposto do que pretendiam.
Que só um casal tremendamente irresponsável é que iria pôr criancinhas no mundo para satisfazer a "fome de netinhos". Que temos a consciência da imensa responsabilidade subjacente à coisa, se um dia quisermos ser pais é porque aceitámos o compromisso com tudo o que isto implica. Que a decisão é nossa, e qualquer que esta seja tem que ser respeitada. Ponto.

A coisa resultou com os meus sogros. Há bastante tempo que nem tocam no tema. Muito de vez em quando um deslize pontual por parte da minha sogra, mas morre rápido.
Se continuam a pensar nisso, não sei, talvez, é provável. Pelo menos já não puxam conversa sobre isso e eu agradeço.

Com os meus pais, pelos vistos nem tanto. Acalmaram, mas ainda continuam obcecados.

Quando a minha melhor amiga foi mãe notou-se que ficaram com esperança que, de alguma forma e por um qualquer motivo, isso me fizesse mudar de ideias.
Fizeram uma última investida, voltaram à carga. Certo dia, quando se cruzaram casualmente, chegaram a pedir-lhe se ela faria "uma forcinha" para ver se me influenciava.
Quando soube rebolei a rir. Tenho que lhes tirar o chapéu: lá persistentes são!
Tivemos uma nova conversa: que sobrinho lindo é um doce, sim senhor, mas não me fez mudar de ideias.
E dei a coisa por resolvida. De vez. Ou assim pensei eu.


Notei que ainda não, no dia que trouxemos o Kiko para casa. Estava tão entusiasmada e feliz que lhes enviei uma foto do bicharoco, com a legenda: "Parabéns. São avós. Este é o Kiko".
Pronto, falha minha, eu sei!
Na altura pensei que teria piada, e que esta questão dos netos já estava finalmente mais que resolvida. Afinal ando há mais de uma década a dizer que não. Será que só me livrarei da tormenta quando chegar a menopausa?! Chiça penico!

Tive o troco por telefone. Antes de gabarem a beleza do bicho e de quererem saber pormenores, tive que levar a reprimenda, (vá lá, merecida), que quase lhes parava o coração, que por segundos ficaram tão felizes a pensar que tinha finalmente havido um descuido, já que planeado não vamos lá! E logo de seguida, dão com a foto de um cão! Giro, fofo e tal, mas um cão!
(Eu sei, o ponto a que isto chegou!)


Só vos digo, se um dia entrar em casa dos nossos pais, e descobrir que ambos montaram um altar dedicado a um qualquer santo, que se saiba ser padroeiro dos descuidos, destruidor de contraceptivos, não fico admirada. Nada!

A lição a apreender é que mais vale declarar "bébés" um assunto tabu se quiser alguma paz e sossego. É jogar pelo seguro e evitar a todo o custo o uso de vocabulário desse universo.

Na minha cabeça continuo a pensar que hoje não, mas nunca digo nunca. Guardo-me o privilégio de mudar de opinião quantas vezes eu quiser. Mas se acontecer há-de ser por mim, por nós, porque queremos e nos sentimos aptos.

O Kiko, ou se preferirem o "cão", é para além de imensa alegria na nossa vida, o nosso bébé adorado, uma certa "evolução natural das coisas".
Um casal tem de passar com distinção isto de se ter um cão, com o imenso trabalho que dá, a paciência necessária e tudo. Tem de achar isto "peanuts", uma alegria, algo a ser repetido num esfregar de olhos, querer ainda mais do mesmo. E só depois se pode dar ao luxo de pensar sobre bébés humanos, que dão muito mais trabalho, dores de cabeça e aprisionam-nos muito mais.

Sabem o dito "primeiro uma planta, depois um peixe, depois um gato, depois um cão..."?!





terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Vida de cão #5: gastar as energias à fera



O Kiko é uma pulga eléctrica.

Na teoria, já estava preparada para isso e muito mais. As crias são assim, com umas pilhas duracell e danadas para a brincadeira. Junte-se o facto do Kiko ser um Jack Russell e temos cão para, se ligado à corrente, gerar electricidade para o prédio inteiro.

Não o poder passear ainda limita-nos muito. Vai ser excelente quando tal for possível por dois motivos: necessidades fisiológicas na rua, e gastar-lhe as pilhas com umas corridinhas e caminhadas.

Até lá os brinquedos e a criatividade são os nossos melhores amigos.

Comprámos-lhe três brinquedos que ele adora: bolinhas de ténis, um osso de corda, e um pato feito de tecido resistente e com extremidades em corda.

Então há que brincar com ele para lhe gastar o excesso de energia. É atirar-lhe a bola ou qualquer um dos brinquedos que ele vai buscar tudo, mesmo o pato que é quase do seu tamanho. É deixar que ele fique frenético, a puxar por uma das extremidades do osso ou do pato enquanto puxo pelo outro, atiçando-o.
Convém, como já aprendi por experiência própria, ir fazendo pausas quando ele fica muito excitado, antes que tente abocanhar brinquedo, dedos e tudo o que vier. Então, pauso, mando-o sentar-se e ficar. Deixo-o esperar um bocadinho e só depois recomeçamos a brincadeira.

Outra característica dos pirralhos é quererem explorar tudo com a boca. Nos primeiros dias, em que o objectivo era ambientar-se bem à sua nova casa não o chamámos à atenção. Mas agora é importante estabelecer regras, indicar-lhe o que pode ou não morder, ser consistente mas um bocado indulgente por ser um bébé.
O que nos esforçamos para fazer quando morde algo que não deve, ou alguém, é dizer-lhe não ou um "shhhht", e depois dar-lhe um brinquedo que ele possa roer.



A melhor empresa do mundo #3: Apoio à Parentalidade


No que toca à taxa de Natalidade, Portugal é uma referência. Adiantam os meios de comunicação, que temos a segunda mais baixa taxa de fecundidade do Mundo, (aqui), apenas ultrapassados pela Bósnia-Herzegovina; e que tivemos a taxa mais baixa de toda a Europa em 2013, (aqui).

A leitura que me atrevo a retirar das estatísticas é que, claramente a parentalidade não é fácil em Portugal.

E porquê?

- Acredito que seja em primeiro lugar por questões financeiras.

Em Portugal os salários são baixos, dos menores praticados a nível europeu. Dizem que o salário médio mensal de Portugal foi metade da média europeia em 2013, (aqui). Estamos a falar de um número que ronda os 984 euros.
Ora bem, se tivermos um casal em que ambos aufiram este valor, líquido, a coisa faz-se à boa maneira portuguesa - com "cabeça", corta daqui, corta dali, sem espaço de manobra para luxos, - e consegue-se criar um núcleo familiar de classe média com uma criança, quiçá duas.
Não nos esqueçamos é que, ano após ano, engrossam a olhos vistos as fileiras de pessoas que auferem o salário mínimo, assim como as que se encontram em situação de trabalho precário e as desempregadas. E que a média, enquanto indicador estatístico apenas nos diz o meio caminho entre o salário mais baixo e o mais alto.


Já ouvi da boca de pessoas idosas, que neste "tempos modernos" se complicam muito as coisas. Que no tempo delas os filhos criavam-se à mesma, quantas vezes em situações de verdadeira dificuldade. Que "quem alimenta uma boca, alimenta duas".

Vejo que a noção de parentalidade modificou-se radicalmente em poucas gerações. Enquanto membros da sociedade já não aceitamos que criança alguma ande aí ao deus dará, descalça, ranhosa e mal-nutrida, como era usual nesses outros tempos.
Hoje em dia esperam-se dos pais coisas tremendas. Dizem que os filhos não chegam acompanhados de manual, mas as expectativas, os tais "o que fazer" dão para encher enciclopédias, com capítulos sobre tudo, desde os brinquedos, à alimentação, saúde, educação, tudo. Não há pormenor demasiado pequeno ou insignificante que não seja explorado até à exaustão. Até porque tudo isto movimenta um mercado de muitos milhares de milhões de euros.

(Verdadeiramente horrível é que, hoje em dia, estejamos a perder a batalha contra a pobreza infantil. aqui)

Já não se trata somente de esticar o pão para alimentar mais uma boca. São as fraldas, os leites de farmácia e as papas, os mil e quinhentos acessórios, cadeirinhas e carrinhos, roupas, as consultas no pediatra, as actividades de lazer, e a mensalidade do infantário que, se for um filho, leva uma imensa talhada do salário, se forem mais, torna-se geralmente impossível e faz com que compense que um dos cônjugues fique em casa a olhar pelos miúdos.
Sortudos dos que podem contar com os avós para isso!

Depois penso na licença de maternidade, do quanto esta é curta, das amigas que são mães, do aperto que sentiram em terem que voltar ao trabalho, separando-se de um bébé tão novo, tão pequenino, tão indefeso, tão dependente delas.

De como as empresas se habituaram ao mau vício de maltratar as pessoas até na questão da parentalidade. Com que à vontade é que se vai contra a lei, impunemente, e se questiona durante uma entrevista de emprego se a pessoa pensa ter filhos, de a preterir se o confirma. E de isto ser a ponta do iceberg!


- Que faria eu, na melhor empresa do mundo?

Um dia estava a ver um episódio da série "Bones/Ossos" e fez-se luz. A personagem Ossos e a sua melhor amiga Angela tinham sido ambas mães, e embora tivessem que lidar com o regresso ao trabalho e tudo o que isso implica, os bébés estavam a metros de distância, num infantário dentro do próprio Jeffersonian.

Por isso, a melhor empresa do mundo teria um infantário.

Mais uma vez, seria uma infraestrutura aberta a outras empresas em redor, com a intenção de diminuir os custos. Não seria um benefício cedido gratuitamente, mas sem dúvida que a mensalidade seria muito mais baixa do que os preços normalmente praticados, pois o objectivo não seria nunca gerar uma grande margem de lucro, mas sim cobrir os custos e conseguir algum excedente para continuamente investir na manutenção e melhoria das instalações e serviços prestados.

Para além de ser uma ajuda às famílias a nível financeiro, também teria um grande valor emocional, visto que pais e crianças não teriam que passar por uma grande separação.



domingo, 7 de dezembro de 2014

Vida de cão #4: A primeira semana



Hoje faz uma semana e um dia que fomos buscar o Kiko.

E tanto que aconteceu em oito dias!

Na quinta-feira fomos à clínica veterinária levar a segunda dose das vacinas, e do desparasitante interno.
Aproveitei a viagem e já foi microchipado. Tudo certinho.

Levei-o com coleira e trela, mas ao colo, enrolado numa toalha de praia.
Tremeu pelo caminho, talvez num misto de medo e frio, mas quando chegámos não demorou muito a querer deambular, cheirar e conhecer todos os cantos, de cauda alçada.
Mostra bom temperamento, curiosidade e é, até ao momento, sociável com todas as pessoas.

Acho que ajudou o facto de ter levado no bolso do casaco um daqueles sacos para sanduíches com alguns pedaços de ração, para lhe ir dando.

Sem dúvida que ajudaram na hora de o fazer engolir o comprimido desparasitante. Apetecia-lhe mais brincar com ele do que comê-lo, mas misturado com alguns pedaços de ração a coisa foi, sem dramas. Inclusive, os tais pedacinhos tiveram o efeito mágico de fazer passar rápido o trauma do implante do microchip.
Um daqueles momentos em que a experiência de ter cães e gatos difere como do dia para a noite.

Ele está óptimo. Pesa 3kg certinhos. Apenas tem a pele um bocadinho vermelha, fruto do circo de pulgas que trazia no lombo.
Há-de passar rápido, visto que também lhe demos a pipeta para matar essa bicheza toda no próprio dia em que o trouxemos para casa.

Todos os dias puxamos por ele, tentamos ensinar-lhe novos truques e comandos. Ele é rápido a aprender e nota-se que gosta de o fazer.
Já senta, já fica, de vez em quando o jogo em que atiramos a bola e ele a devolve também funciona, já anda de trela ao nosso lado esquerdo, e até já resolvemos a questão da copofragia, que para quem não sabe é o acto dos animais comerem as fezes.

Não é tão nojento quanto parece, nem o bicho sofre de nenhum problema mental.
O que acontece é que na natureza as mães comem as fezes das crias para que os predadores não sejam atraídos pelo cheiro. As crias podem, naturalmente, demonstrar a tendência para as imitar.

Foi fácil de resolver com a ajuda de uns pedaços de ração. Aproveitando os momentos em que ele fazia um cócó, pedia-lhe para focar em mim e não na caca. Como recompensa, um croquete.
Num par de vezes perdeu essa mania.

Hoje foi pela primeira vez à rua. Uma voltinha muito rápida, sempre ao colo, para conhecer pessoas, habituar-se aos sons e cheiros.
Infelizmente, passeios a sério, só em Janeiro.
Segundo o conselho das veterinárias, ao que parece deram-lhe as primeiras vacinas demasiado cedo.
Como resultado podem não ter tido o efeito pleno desejado porque os anti-vírus do leite materno combatem tudo, inclusive o que é injectado na vacina.
Então vamos jogar pelo seguro, e esperar pela terceira dose para as idas à rua, e contacto com outros animais. O seguro morreu de velho, e andam por aí umas estirpes manhosas de parvovírus.

Chichis e cócós no resguardo que existe para o efeito é que nada ainda. Havemos de chegar lá.
O balanço da primeira semana é muito positivo, o que trará a próxima?


sábado, 6 de dezembro de 2014

cromices #60: Ah, o cheiro a napalm logo pela manhã!



Um dia, quando for grande, quero ser uma pessoa zen. Daquelas que emanam serenidade por todos os poros e são impertubáveis, haja o que houver. Tipo Dalai Lama.

Acho que só o facto de o desejar dá claramente a entender que sou o oposto. Há momentos em que penso que, se fosse cão, era um daqueles chihuahas, em modo irritadiço e irritante.
Ou se preferirem, alguém com a disposição esperada para um cenário de guerra tipo Vietname: tensa, hirta, alerta, a voz sai com o volume mais elevado do que desejaria, e pareço pronta a apertar o gatilho à mínima coisa.

Mesmo assim o jogo não acaba a zeros. Ponto de honra por me aperceber, e por tentar melhorar.

Hoje de manhã tinha dado um jeito tremendo ser como o Dalai Lama.

Ainda estamos em período de adaptação cá por casa. A habituar-nos ao Kiko, às nova rotinas, a corresponder ao que ele necessita de nós, à cena do reforço positivo em todas as situações.

Faz hoje uma semana. Estamos felizes mas exaustos. Parecemos uns zombies.
O Kiko é óptimo, tendo em conta que é um bébé, e com donos inexperientes, porta-se lindamente. Da nossa parte, acho que também merecemos, não 20 valores, porque a ignorância tem o seu peso, mas ainda assim uma nota positiva.

Hoje de manhã, bem cedinho, o marido acorda mal-disposto. É uma intoxicação alimentar. Como ambos comemos e bebemos exactamente a mesma coisa, ando à espera da minha vez, mas a rezar para que não aconteça. É que dá um tremendo jeito que um se mantenha apto para cuidar do outro, do Kiko e de tudo o que apareça.

Fomos tomar o pequeno-almoço numa esplanada bem perto de casa, não fosse o diabo tecê-las.


Pequeno-almoço servido e chega um dos nossos amigos caninos, o Ianni, (dúvidas sobre a grafia correcta).
O Ianni é um cão com alguma idade, preto e grande. É um bom cão, como todos os cães, gostamos dele. Mas é um cão muito chato, que mói a paciência a um santo.
Chega à esplanada e anda pelas mesas a pedinchar comida. Entra no "espaço pessoal" das pessoas, ladra, excita-se, não desiste, chateia.
É claro que a culpa não é dele, é dos donos. Não lhe deram a educação devida, deixam-no andar ao deus dará, não se importam nada que existam n pessoas pela localidade que o alimentem, até lhes dá jeito, comportam-se irresponsavelmente e até já ouvi vários relatos que me fazem acreditar que não o merecem, como não lhe abrir o portão num dia de chuva e tempestade.

E eu enfureço-me com estas pessoas e já não há-de faltar muito para lhes ir bater à porta a deitar faíscas dos olhos, porque naquele minuto tenho ao meu lado um marido cadavérico por causa do mal-estar, queremos paz e sossego enquanto tomamos a nossa refeição, e há ali um cão que lá por gostarmos dele não significa que não seja um melga de primeira, com um comportamento que nenhum cão deveria ter.
E é isso que estou quase quase a ir lá dizer-lhes: que um cão é para estar em casa, bem alimentado, protegido dos elementos. Não na rua a exibir comportamentos incorrectos, a incomodar, e sobretudo a correr o risco de ser atropelado porque anda sem trela.

Entretanto marido levanta-se de repente. Diz que já volta e corre até casa. Foi vomitar.
E eu ali fico à espera dele, a olhar para o relógio do telemóvel a pensar que mais 5 minutinhos e cago nisto tudo, o cão que devore as torradas todas que eu vou para casa.
Vão aparecendo amigos e perguntam-me sobre o Kiko. Passam alguns minutinhos.

Chega um casal com um miúdo e sentam-se na mesa ao lado. Estou rodeada por uma criança e um cão tremendamente excitados. Está tudo bem.
O miúdo interpela-me. Pergunta-me se o cão é meu. Trata-me por tu. Digo que não, que não é meu.
Pergunta-me se lhe pode dar festas, e antes de eu ter tempo para responder já está em cima do cão.
Os pais nem se mexem. Eu aviso que o cão não é meu, que acho que lhe pode dar uma festinha, com cuidado e meiguice,  sem exageros. Que tudo deve acontecer sob supervisão, que não me responsabilizo.
O miúdo abusa. Eu volto a avisá-lo que tem que ser meigo. Os pais não se mexem, mas desta vez dizem-lhe qualquer coisa a respeito.
O miúdo continua a tratar-me por tu. Nem todas as crianças são assim, mas este tem modos de pigmeu abrutalhado. Nota-se que está a passar por uma fase (?) qualquer em que gosta de ser um "bocado" malcriado com os adultos, demasiado enérgico no mau sentido, que anda a testar os limites e, não vi que lhe metessem o travão nisso.

Pergunta-me pela enésima vez se o cão é meu, se não é meu de quem é, e quem é que estava sentado comigo, porque estão dois copos na mesa e só lá estou eu, e novamente se o cão é meu...

Não lhe satisfaço todas as curiosidades, era só o que faltava!
Quando não lhe quero responder, sobretudo porque não tem nada a ver com isso ou quando já lhe respondi à mesma questão demasiadas vezes, ignoro-o.
Afinal não é só o cão que precisa de treino.

Respiro fundo, esboço um sorriso. Tento ir às profundezas buscar uma paciência que hoje me falta. Mas as reservas estão em baixo, e eu acabo por lhe dizer que quando for grande deveria ir trabalhar para a Polícia Judiciária, que tem jeito para interrogatórios.
Nada mau, diga-se! - mentalmente estava pensar mais num "porra que és mesmo chato!".

Aplausos para o Ianni que se portou bem com o mini melga. Lá está, é um bom cão, só precisa que os donos se comportem melhor.

Quando se foram embora, pouco depois, dei-lhe umas festas e mais um bocado de torrada para o recompensar pela paciência.
Há tantas opiniões quanto pessoas, mas eu gostaria de ter visto pais mais assertivos. Que, com calma e carinho, guiassem o puto para outro comportamento.
Que o lembrassem de várias coisas: que não se tratam adultos, especialmente desconhecidos, por tu; que enquanto não acalmasse não se poderia chegar perto do cão para lhe dar festas, que um deles o tivesse acompanhado nisso, que ao fim de repetir três vezes a mesma pergunta o chamassem à atenção.
Volta o marido. Consegue a custo mastigar mais um naco de torrada.

Neste momento só eu ando por aqui acordada, a fazer tudo o que é necessário para que os meus dois rapazes estejam bem.



quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Ufa, que alívio!



Afinal era uma boa pessoa. "Somente" despassarada.

Finalmente tudo a andar bem. E ontem, pela primeira vez em algum tempo, dormimos como bébés.

Ufa.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Vida de cão #3: Chichis e cócós



Os cães quando são pequeninos não têm controlo sobre as necessidades fisiológicas. É mesmo assim.
Se não me engano, acho que só a partir dos 6 meses é que começam a desenvolver essa capacidade, a guardarem-se para quando forem à rua.

Sobretudo por esse motivo, castigar um cãozinho porque fez as necessidades no sítio que não desejamos é ineficaz e cruel. Só servirá para assustar e traumatizar a criatura.
Isso inclui aquela mania que algumas pessoas perpetuam de esfregar o focinho do cão na poça de chichi.
Há que ter alguma empatia e sensibilidade. Decerto nenhum de nós gostaria que nos fizessem o mesmo, especialmente se não conseguissemos controlar o que fazemos, quando e onde.


Na véspera de irmos buscar o Kiko, passámos numa loja de animais. Trouxemos o enxoval básico: cama, manta, brinquedos para roer, escova, coleira, trela, produtos para o pêlo e banho e uns resguardos.

Estes resguardos são feitos de um material absorvente que faz lembrar as fraldas dos bébés.
Costumam ser vendidos em conjunto com uma base de plástico toda pipi, mas que optei por não trazer. Achei que seria um desperdício de dinheiro pagar por um acessório que não considero essencial, é somente uma paneleirice, e terá um período de vida útil muito curto, pois a partir do momento em que cão faça as necessidades na rua deixa de ser necessário.

Assim em vez de pagar 20 euros pela base de plástico e mais 5 por uma embalagem de resguardos, trouxe só os últimos. 20 euros que já deram para comprar um saco de boa ração para puppies.

Escolhemos um cantinho da casa de banho para colocar o tal resguardo. É claro que é preciso acima de tudo muita calma e paciência para que o cão aprenda a fazer as necessidades aí.

Por calma e paciência entenda-se esfregona sempre à mão, bons reflexos e articulações bem oleadas - a sério, fica-se nas posições mais estranhas quando no último segundo se dá com uma poça de chichi e há que fazer tudo por tudo para não a pisar. Depois é, como nos ensinaram, agarrar no bicho, exclamar um não!, levá-lo ao resguardo e fazer daquilo uma grande festa.

- Kiko! Chichi! Kiko, cócó! Lindo menino! - repetido ad nauseam, com muitas festas e brincadeira à mistura.

Lemos algures que o intervalo entre comer/beber e fazer as necessidades é curto, que uma opção após a ingestão de alimentos é levar o bicho para tal cantinho e brinca-se com ele até a coisa acontecer.

Já o fiz. Mas é aquela coisa da lei de Murphy. Por mais tempo que lá fiques à espera, o cão só se vai soltar no momento em que for para outra divisão.

Mesmo assim, eu que nunca tinha tido um cão, estava à espera de um cenário muito pior.
Hoje é somente o quinto dia.
Já conseguimos que ele simpatize com o resguardo. Há momentos em que ele até vai para lá brincar.
Ontem fez lá o primeiro cócó, sozinho, sem incentivos nem pressões. Hoje de manhã, a mesma coisa.
Nada mau!

Chichis é que não. É dar-lhe tempo.

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Não me ando a sentir nada bem



Eu odeio irritar-me. Sobretudo chateia-me que me obriguem a ser chata.
Faz-me mal à saúde, embrulha-se-me o estômago, baralha-se-me a tripa, fico vai não vai a pensar se vomito, dão-me tremeliques, e dói-me tudo.

Já tive tanto stress na minha vidinha, que gastei de vez a resistência que tinha para com as chatices, tipo os calços dos travões.
Se outrora fui, ou pelo menos parecia um couraçado, hoje nem pensar nisso.

Ora, há uma pessoa que se anda a portal muito mal connosco.
Que ficou de nos enviar algo segunda-feira sem falta. Amanhã já é quarta-feira.

Só não a identifico publicamente, porque ainda lhe dou hipótese de redenção e preciso mesmo daquilo. É meu de direito. Já cá devia estar na minha mãozinha, sem atrasos nem desculpas, com um sorriso e um agradecimento.

A pessoa já admitiu ser assim... despassarada, desatenta. As informações que me chegam é que, sim senhor, é boa pessoa, mas lá está, uma pessoa muito cabeça no ar, desorganizada, que nunca trata das coisas a tempo e horas.

Dou por mim a ter que lhe ligar todos os dias. E eu odeio visceralmente fazê-lo e odeio que mo façam. Acima de tudo odeio este tipo de pessoas que falham com os outros, que nos forçam à condição de chatos.
Somos todos adultos, deveriamos agir como tal. De forma responsável. A irresponsabilidade de uns pesa sempre nas costas de outros, e gera úlceras e mal-estar.

Redima-se e não haverá parte segunda deste post. E eu torço para que isso aconteça. Mesmo!

Continue a dar-me cabo da pouca sanidade que me resta, e passo do modo gentil assertivo para o modo besta destravada.

cromices #59: A emoção dos descontos


Já por meia dúzia de vezes apanhei na televisão o Extreme Couponing, aquele programa em que vemos donas de casa a sairem dos supermercados com vários carrinhos completamente atestados de produtos quase à borla.

Sendo coisa que se passa lá para as Americas seria impossível que a coisa não se pautasse pelo exagero, e até uns certos laivos de absurdo. Pelo menos assim parece aos meus olhos europeus.
Na minha cabeça uma pessoa "normal" não precisa de uma centena de frascos de molho para salada ou refrigerantes, e isso de andar a catar o contentor do lixo à caça de cupões, como se vê em alguns episódios do programa, não me convence.

Tal como por cá, quando existem eventos promocionais que atraem muita gente e dão origem a um caos infernal, que teve naquilo do Pingo Doce o maior expoente nacional, eu sei bem onde vou: para bem longe. Como já assisto ao UFC pela televisão não sinto propriamente a necessidade de ver velhotas, num combate até à quase-morte, armadas com frangos congelados e cuvetes de bifes.

Por outro lado quem não entende o apelo da poupança. Certo?!

Também gosto de poupar. Quem não gosta?
Então ouvi dizer que no supermercado cá do burgo havia coisas com 50% de desconto. Desconto directo, que é dos melhores que existem.

Saquei do tablet e analisei o panfleto da promoção.
Recuso-me a comprar coisas que não preciso nem uso só porque estão baratas.
Entretanto a coisa começou-me a agradar, estavam presentes alguns produtos que já costumo comprar: o mesmo detergente para a louça, gel de banho, papel higiénico, amaciador e afins.

Decidi aproveitar. Já que tinha que ir lá mesmo buscar frutas, legumes e outros essenciais.

Com alguns trocos que tinha no cartão cliente o desconto total ficou em quase 30 euros.
E de repente vi a luz!
Há uma certa descarga de adrenalina contida no acto de não pagar a totalidade do preço.
E de repente, vi-me em versão americana, a liderar um comboio de carrinhos de compras cheios de paletes, não de molho para saladas ou coca-cola, (vade retro!), mas pronto, vá lá, águinha das pedras e mostarda.




segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Vida de Cão #2: O Compromisso



Os animais podem ser muitas coisas: membros da família, companheiros, melhores amigos, terapeutas, guias, e sem dúvida, maravilhosos. Todos eles.

Não são brinquedos, muito menos descartáveis.


Há quem encare os animais de estimação como filhos, e eu pertenço a esse grupo de pessoas.

Sei que há muita gente que não entende tal conceito, que revira os olhos e se benze perante tal ideia, que nos acham maluquinhos.

E eu continuo na minha, não só por uma questão emocional, mas também racional:
É que, tal como um filho humano, o nosso animal de estimação depende de nós para tudo. Para alimento, abrigo, afecto, protecção, assistência médica e educação.

Ambos, seres humanos e não humanos contam com a figura que encaram enquanto pai/ mãe / tutor/ guardião / seja lá o que queiram chamar, para tudo isso. Procuram-nos se têm medo, fome, sede, se estão tristes ou alegres, se necessitam de orientação, se estão doentes, se querem carinho ou brincar. Ambos nos observam, nos imitam, aprendem connosco, e acabam por ser de certa forma o nosso reflexo. Espelho das nossas capacidades e incapacidades.

O meu senso dita-me que qualquer pessoa que demonstre estar apta para tal, sendo consciente e cumpridora, mostra ser Pai ou Mãe, honrando a essência do termo, seja para com um menino ou um cãozinho.

Conheço pessoas de tal forma responsáveis com o papel que assumiram com os seus animais, e até com os animais de "ninguém",( as vítimas de um imenso infortúnio, da negligência e da crueldade, que esperam por uma verdadeira família), capazes de envergonhar muitos pais de crianças humanas, cuja maior aptidão para a parentalidade é terem orgãos genitais. Infelizmente, também existem demasiadas crianças que mereciam bem melhor, perdoem-me o eufemismo.
Sobretudo aqui considero que não há diferenças entre crianças e animais: um só animal ou criança maltratados é um a mais!

Para mim, a grande diferença é a esperança de vida. De um filho humano espera-se que continue a viver mesmo depois de partirmos. É a ordem natural das coisas. Acredito que, quando essa ordem é subvertida, deve ser a dor mais atroz e tenebrosa.

Um animal, em comparação, vive muito menos. Já o sabemos à partida, mas na realidade, acho que ninguém está preparado.
Da dor que advém da perda de um animal sei falar. Já a senti e é das coisas mais horríveis com que já tive que lidar na vida. Deixa marcas.
O que acontece é que com o passar do tempo as memórias felizes vão-se sobrepondo ao sentimento de perda, de luto em todas as suas fases, da tristeza à frustração, da dor à ira.

Por exemplo, eu que perdi o Ulisses para uma doença auto-imune, e os manos Eros e Zeus para a insuficiência renal tive uma longa fase de luto, em que me senti tão, mas tão zangada com o "Universo" pelo nosso destino. Tão furiosa e frustrada por ter dado o melhor de mim, de ter procurado agir sempre de forma certinha e responsável e, mesmo assim perder a batalha contra as doenças. Senti-me pequenina e impotente. Tão triste e vazia sem eles.

Agora, anos depois, recordo-os transbordando unicamente de afecto. As tais memórias felizes que nos fazem sorrir.
Senti-me (sentimo-nos) preparada para um novo compromisso, e foi dessa vontade que surgiu o Kiko, que agora enquanto escrevo se encontra a dois passos de distância, num sono de primeira infância.

(Pausa na escrita. Pôr a máquina da roupa a trabalhar pela terceira vez hoje, dar-lhe de comer, limpar mais um chichi, e brincarmos com a bolinha. Retomo o post, sempre dá para descansar um bocadinho. Adiante...)

Ora bem. Nunca tinha tido um cão.
Sempre que alguém me vinha pedir conselhos e opiniões sobre gatos, eu fazia questão de frisar os aspectos mais trabalhosos e chatos da relação. Falava dos cócós, dos vomitados, do pêlo, dos custos com veterinários, dos objectos arranhados...
Fazia-o porque há que fazer esmorecer aqueles que não estão preparados para lidar com o pacote completo do que significa ter um patudo na família. Fazia-o pelo animal.
Só depois falava dos afectos e de toda a magia que surge da cumplicidade entre um humano e um animal. De não se saber porra nenhuma sobre reciprocidade e amor incondicional até aquele momento.

Também isto não é diferente no caso de uma criança humana. Acho que ao invés de andar toda a gente a tentar impingir a maternidade, frisando uma e outra vez que é uma coisa maravilhosa, o tal "tens que ter!", mais valia focarem os outros pontos, aqueles mais chatos. Tipo as noites sem dormir, as fraldas cagadas, os custos com saúde, educação e tudo o resto, a possibilidade de terem uma "criança" em casa por mais de trinta anos. Pelas crianças. Para que quem pense que quer assumir esse papel, saiba ao que vai, reflicta, queira mesmo. Que saibam que não é uma gravidez que faz ou salva uma relação amorosa entre duas pessoas.
Só depois do sermão deveriam falar na redenção da alma humana através da alquimia suprema.

Fizemos exactamente o mesmo connosco a partir do momento em que o assunto "cão" veio à baila.

Aceitei o compromisso, o tal do pacote completo.
Embora o Natal esteja perto, não foi uma decisão impulsiva. Ponderámos, pedimos ajuda a quem conhece e sabe, pesquisámos, procurámos "o" cão, aquele cujo perfil casa melhor connosco. Aquele que na sua perfeição inata se adequa melhor aos donos que vão dar o melhor de si, mas que ainda têm muito para aprender.
With eyes wide open.


Hoje, ao terceiro dia, após pulgas, muitos chichis e cócós, não esmoreço. Estou feliz.
O compromisso é para toda a vida, e 15 anos parece tão pouco, mesmo ao virar da esquina.



Vida de Cão #1: Programa de Domingo à noite



Nós os três, (eu, o marido e o Kiko), no sofá a ver o Cesar Millan.