terça-feira, 29 de dezembro de 2015

100 motivos para não ter filhos #2: Pilhas do chinês.



Eu não tenho muita energia. Costumo dizer, para brincar com a situação, que há pessoas que nasceram com pilhas Duracell, enquanto eu tenho daquelas muito rascas da loja do chinês.

Com o passar dos anos tive que aprender, por tentativa e erro, a dosear a energia que tenho, e isso implica uma gestão minuciosa de tempo e tarefas, saber dar prioridade a umas e, inevitavelmente adiar outras. Porque se não o fizer o castigo será uma miscelânea de dores e uma exaustão que se sente como um pedregulho em cima das costas, da qual a caminho dos quarenta já não me refaço com tanta facilidade como aos vinte.

É uma coisa que me acompanha desde sempre. Já em criança quando tinha um dia mais puxado o cansaço acumulava-se nas pernas, e estas doíam-me tanto que me impediam de dormir. Tenho uma memória longínqua dos meus pais a esfregarem-me as pernas com qualquer coisa para me aliviar, e eu a chorar de dores e exaustão.
Recordo com espanto e incredulidade a época em que, simultaneamente, trabalhava em Cascais, estudava em Lisboa, namorava e saía com os amigos. Também me lembro que mal me sentasse no autocarro ou no comboio, ou até no cinema, apagava.

Esta fragilidade, este defeito de fabrico, que é bem real e castigador, é para mim um tremendo entrave a muitas coisas, uma delas a maternidade. Assim o considero.

A minha Mãe é muito enérgica, activa e dinâmica. E é assim que imagino todas as mães. Bem, pelo menos as "boas" mães, as capazes. Aliás, imagino que a função assim o obrigue. O tempo é escasso e há sempre muito muito muito para fazer, que nunca deixa de ser muito mesmo quando dividido com pai e avós, e há que chegar a tudo, obrigatoriamente.

Costumam dizer que se arranja sempre maneira. Já me disseram isso várias vezes no que toca a esta questão, o que me levou a sacar de uma balança imaginária para ponderar a mesma.
Para além das coisas não serem lineares como nos querem fazer crer às vezes, uma das conclusões a que cheguei é que estou a anos-luz de querer filhos na medida necessária para anular o outro prato da balança. Nesse outro prato, entre outras coisas, está esta coisa da energia e do cansaço, e é um calhau com um peso bastante considerável.

É que o que se regista no plano físico pesa também no psicológico. Pesará sempre na psique todo e qualquer mal estar.
Não acredito que tenha energia suficiente para alimentar o papel de mãe de forma satisfatória, especialmente sem negligenciar, grosseiramente até, os outros papéis e pessoas da minha vida, inclusive eu própria.
Não acredito que uma mãe, (ou pai), que viva exclusivamente para esse papel seja a melhor das mães. Alguém que se esqueça de si próprio, que menospreze as várias facetas e pessoas da sua vida, está a dar um péssimo exemplo.
Quantas mulheres, (especialmente mulheres), conheci ao longo da vida que, chegando a uma certa idade estão gastas, amargas, com uma expressão constante no rosto de dor e cansaço? Muitas zangadas com a família, o mundo, o destino e a própria vida porque deram tudo de si, e a agora não vêm chegar o retorno esperado!
A prole cresceu e tem a própria vidinha e não lhes dá nem um décimo da atenção e dedicação que esperavam, porque o que deram e que agora esperam não é a dose recomendada. Deram demais, deram tudo sem que lhes fosse pedido que assim o fizessem, e nunca haverá retorno para tal investimento quando colocamos todas as sementes em campo alheio e nos largamos, qual terreno ao abandono.






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