quarta-feira, 27 de maio de 2015

cromices #79: Nada se perde, tudo se transforma...



Foi o que aconteceu com os muitos cigarros que ficaram por fumar hoje: transformaram-se numa fatia de bolo. Não resisti a escolher a maior e mais decadente, cheia de camadas de creme.

coisas que me irritam #16: O verdadeiro significado de andar aos papéis ou, se preferirem, a função pública no seu melhor



Por coisas cá minhas e dos meus projectos preciso (muito!) de um determinado papel.

Tomar posse desse papel exige toda uma demanda pelos meandros da burocracia.

Coisa pouca:
Basicamente Pessoa #1 fez-me chegar através de Pessoa #2 uma resma de papéis, com os quais me dirigi ao Organismo Público #1, para conseguir mais um papel. Onde fui informada que, munida de todos os papéis, me deveria dirigir ao Organismo Público #2, pedir mais um papel, que deveria depois levar ao Organismo Público #3, onde finalmente me dariam um papel com poder hierárquico sobre todos os papéis, uma espécie de super-papel, de Graal dos papéis, com o qual poderia voltar ao Organismo Público #2, e quem sabe, aí, conseguir o "tal" primeiro papel que me faz uma tremenda falta.

No Organismo Público #1 as coisas correram tremendamente bem: tomaram-me muito menos tempo, energia e dinheiro do que estava à espera. Para além de sair de lá com o devido papel, quem me atendeu foi amável o suficiente para me informar dos passos que deveria seguir.

O passo seguinte seria ir ao Organismo Público #2 pedir um de dois papéis, o que fosse mais barato porque em ambos está contida exactamente a mesma informação.

Fui confiante.
Tiro a senha. Espero. Chega a minha vez. Exponho a situação. Peço aconselhamento sobre qual dos meus papéis me convém. Parece ser à escolha do freguês, a diferença é que um leva o selo branco, que dá um ar mais oficial à coisa. Pelo sim, pelo não, escolho esse. "Ah, então vai ter que tirar outra senha, que isso já não é comigo". Tiro a senha. Espero. Chega a minha vez. Exponho a situação. Dizem-me que afinal não posso pedir o papel com o tal selo branco, que afinal só posso pedir o outro. Ainda me perguntam qual prefiro, o que quero fazer. Abro muito os olhos. Respondo que a decisão é óbvia. Que, se entre duas hipóteses, uma é eliminada, só restando outra, não há muito por onde decidir. A estagiária olha para mim como quem olha para um palácio. Eu simplifico: "quero o papel A, por favor". Fica confusa, chama a superior, e dizem-me que então já não é com elas, mas com a primeira técnica que me havia atendido anteriormente. Entretanto já passou tanto tempo que está quase quase no horário de encerramento, o que faz que ande tudo em alvoroço. A superior decide atender-me. Diz-me que corra até à maquineta tirar outra senha. Imprime um formulário para eu preencher e sai de cena. Preencho 90% da coisa até me surgirem dúvidas: não domino a linguagem técnica da coisa. Prefiro pedir ajuda a ter que refazer tudo. Olho em redor. Não tenho outra hipótese senão levantar a voz e perguntar de forma bem audível se não há ninguém que me ajude no procedimento. Passados mais alguns minutos de espera, quem acaba por me atender é a primeira técnica. Dá-me um papel que serve para provar que fui ali pedir um papel. Papel esse que me deveria chegar a casa passadas 3 semanas.

Isto foi no dia 7 do mês passado.

Entretanto telefonei o número indicado no tal papel que me foi dado. Número de um Organismo Público #4, pelos vistos responsável pela gestão do meu processo.
Atendem-me. Exponho a minha situação. Informam-me que a "chefe", que é também a gestora do meu processo, não está. Foi almoçar, embora sejam 15h e o horário de atendimento ao público termine às 16h. A rapariga do outro lado da linha é simpática, espelho da minha própria atitude. Informa-me que a forma correcta de comunicar sobre o meu processo é através de e-mail. Mesmo assim, pede-me o número de telefone e as referências processuais. Vai deixar um recado à chefe, para que me ligue.
Ninguém ligou. Nem nesse dia, nem no dia seguinte. Envio um mail. Exponho a minha situação. Recebo uma resposta automática acusando a recepção do mail. Até hoje, mais nada.

Já ando cansada dos inúmeros contactos com a Pessoa #2 em que a conversa não passa da desconversa sobre a estagnação do processo.
Já coro, fruto da vergonha alheia, como se a ineficiência fosse minha.

Rio da situação. Parece uma anedota das más. Rio para não chorar, porque nesta demanda pelos papéis ainda a procissão vai no adro. Não me ocorre que mais possa fazer. Já começo a entender o que leva aquelas pessoas a passarem-se de tal forma da marmita que se barricam nos tais organismos públicos, com armas de fogo, reféns e trinta por uma linha.
Não chego a tanto, mas apetece-me passar por lá para pedir o livro de reclamações. Já o teria feito se não achasse que este pessoal da função pública é capaz de ter mau feitio e retaliar de forma a que nunca mais veja papel algum.


sexta-feira, 22 de maio de 2015

coisas de opinar: shame on them, shame on us!




Agora que os ânimos acalmaram um pouco em relação aos casos de violência juvenil que têm incendiado os media e a opinião pública nos últimos tempos, acho que é a altura mais correcta para partilhar a minha opinião.


Confesso que não é a primeira vez que me sento aqui a debitar caracteres sobre este tema. Em todas as outras vezes optei por apagar os rascunhos. Se a maturidade me serve de algo é, de me dar por vezes, a lucidez necessária para não tornar público um ponto de vista sobre qualquer matéria que não seja mais que um subproduto de fígados inflamados.
É que a quente também eu solto desabafos como "mata e esfola, faz e acontece". Quando na realidade, descascadas todas essas camadas emotivas, reacionárias, tenho é pena dos miúdos e, consequentemente, de todos nós.


É que, independentemente da época, torna-se mais fácil para qualquer miúdo tomar decisões mais decentes na vida se estiver rodeado de exemplos e influências positivas. É que deixá-los ao deus dará nunca na história do mundo trará bons resultados.
É da natureza de todas as crianças e jovens deixarem-se influenciar por tudo o que existe ao seu redor, seja bom ou mau. São como esponjas, como macaquinhos de imitação. Saber separar o trigo do joio não é uma competência inata, tem de ser ensinada. O que requer tempo, amor, positivismo, paciência, disciplina, know how, consistência e muita dedicação. Ênfase em todos os itens, pois todos são igualmente necessários a uma educação de valor.

Os bons modelos não nascem simplesmente. São fruto de uma labuta árdua, de um investimento constante por parte de todos os envolvidos na sua educação.
Quando aparece uma qualquer notícia em redor do comportamento de um qualquer jovem, o alvo mais óbvio de todas as críticas são os pais. Para além de ser natural, pois são estes os principais educadores, os responsáveis óbvios pela criatura, etc, quase sempre a culpa e as críticas são merecidas.
Mas a culpa não pode morrer solteira, como diz o ditado. Porque, como diz outro ditado, "é necessária toda uma aldeia para criar uma criança". E, se por um momento tirarmos as palas dos olhos saberemos que quota parte da responsabilidade de existirem por aí, em cada vez maior grau e número, membros desta nova geração que nos fazem temer o futuro, e até pensar, por sombrios momentos, que alguns mais valiam não ter nascido sequer, não deve somente pesar nas costas dos progenitores, por mais horrorosos que sejam, mas dividida por todos nós.

Se tivermos que apontar o dedo, (e devemos fazê-lo não simplesmente como exercício de culpa, mas sim com o propósito de diagnóstico como caminho para a cura), devemos passar dos pais para as escolas e todas as pessoas que nestas trabalham.
Porque se é verdade que a educação deve começar em casa, que os principais modelos serão sempre os pais e os familiares que convivem com os jovens, esta deve ser continuamente trabalhada em todos os locais e pessoas que façam parte da sua vida.
E se o horário escolar ocupa tanto tempo, tantas horas diárias quanto um full time, (chega a significar que por vezes os miúdos passam mais tempo na escola do que em ambiente familiar), com que direito é que os professores e o restante pessoal dito da Educação lavam as mãos feito Pôncio Pilatos e simplesmente se descartam de toda e qualquer responsabilidade nesta matéria?!
Pois eu digo que não devem. E por poderem fazer o que não devem é que as escolas, principalmente as públicas, são um reino do caos, onde ao invés de um ambiente seguro onde os pais podem enviar os filhos para aprenderem, abundam violência, drogas, álcool, e até sexo. E não, não estou a exagerar nem um pouco!

É da também da natureza de qualquer jovem testar os adultos, ir puxando a corda como se diz, verificar constantemente os limites, ver até onde o deixam ir. Sublinho que são todos assim, independentemente do ambiente e cultura familiar, estatuto sócio-económico, etc, ou será que já nos esquecemos que também já fomos miúdos?!
Não há pior influência possível para a formação de um jovem que estar inserido num ambiente onde não é controlado, nem chamado à atenção nem disciplinado. Onde tem a liberdade de passar de pequenas a grandes asneiras sem qualquer sanção ou travão. Dito assim parece que enviamos as nossas crianças directamente para serem instruídas por presos em estabelecimentos prisionais, mas estou mesmo a descrever as nossas escolas.

Alguns que me poderão ler, pensarão talvez, "Ah e tal, é verdadeiramente uma pena, mas eu cá tenho o puto no privado."
Digamos que a dimuição drástica da qualidade de um sistema público de ensino que já foi considerado um dos melhores do mundo, (se continuar a ser, digam-me que vou já ali cortar os pulsos!) - a sério, que mania esta a de foder o que temos de melhorzinho, pá! - levou muito boa gente a meter os putos em colégios privados, (nada contra, embora acredite que todas escolas, públicas ou privadas, devam primar pela excelência), o que levou a um boom deste sector porque muita gente, (muitos com mais vocação para o negócio do que propriamente para o ensino e a educação), a achar que estavam perante uma fantástica oportunidade, uma galinha dos ovos de ouro. Em resumo, nem os privados continuam a ser o que eram! Outros tempos, senhores, outros tempos!

Com estas linhas corro o risco de ser tremendamente injusta, (bem o sei!), para com todos aqueles que dão tudo por tudo na sua profissão relacionada com a Educação, com os putos que não descarrilam mesmo sob pressão dos seus pares, para com os pais que realmente se esforçam e até os estranhos que decidem não fechar os olhos, que se envolvem e intercedem. Saibam que vos tenho reconhecimento, mas com meiguices não vamos lá.

Casco na escolas e profissionais da Educação porque sinto que o posso e devo fazer com base na minha experiência pessoal.

Durante o meu percurso escolar passei pelo ensino privado e público. A escola mais exemplar por onde passei foi um colégio de freiras, onde fiz o 5º e o 6º ano, que embora fosse público só tinha vagas para 50 alunos.

Lá não existiam furos - se alguma professora faltasse, obrigatoriamente avisava e outra ocuparia o seu lugar.

Lá existiam horários para tudo: para o lanche, para o recreio, até para as idas ao wc ou atravessar a estrada no fim do dia. Atrasos eram inadmissiveis, faltas eram impensáveis.

Lá a vigilância era constante: havia sempre alguém a vigiar-nos, durante as aulas ou o recreio. Por tal não era um espaço propício à existência de bullying ou de grandes deslizes. Mesmo as pequenas partidas passavam raramente despercebidas, e qualquer traço de mau comportamento era comunicado aos pais nas reuniões. Acho que me lembro de um colega mais afoito a sair da escola, depois de uma reunião, a ritmo de calduços e palmadas por parte dos pais. Ninguém gozou. Os meus pais fariam exactamente a mesma coisa todas as vezes que achassem necessário.
Da mesma forma, as mesmas reuniões eram usadas para elogiar o que merecesse ser elogiado.

Lá a Educação era mais que a transmissão de matérias escolares, ia mais além do que é "obrigatório", do que vem explícito no "programa": desde uma Irmã que ficava de plantão junto dos lavatórios para garantir que todos lavavam correctamente as mãos; que o wc, a sala de aula ou o recreio ficavam arrumados e limpos; que, se necessário fosse ajudaríamos a servir o almoço aos pequeninos da infantil.

Lá existiam regras bem explícitas sobre o que deveríamos fazer e o que era considerado errado, assim como as recompensas e as sanções. Igualmente importante, existia consistência na aplicação das mesmas.

Lá a qualidade do ensino era excelente, tanto que, durante o primeiro ano do Liceu sentimos todos que faríamos aquilo com uma perna às costas.

Pode parecer um ambiente duro, especialmente segundo os parâmetros actuais, mas éramos miúdos totalmente normais e felizes.

A transição para o liceu foi um choque pela diferença. Pessoalmente são memórias com tanto de mau como de bom. Já se notava bem que muitas das pessoas que faziam parte da estrutura escolar se haviam divorciado do papel de educadores, não dando a mínima ao que se passasse fora da esfera de transmissão de matéria, e algumas mesmo nesse campo deixavam a desejar. A escola tornava-se terreno fértil para o bullying, o absentismo, o mau ou, vá lá, pior rendimento escolar, e outros vícios.
Em menor ou maior grau, todos nós alunos, fomos afectados por tal ambiente, tivemos mudanças no nosso comportamento. Porque independentemente do ambiente familiar não há miúdo algum que seja imune ao charme da quase ausência de consequências ao peer pressure.

Parte de mim sempre lamentou que o tal colégio de freiras não desse aulas até ao 12º ano, que não fosse o modelo regente em todas as escolas.

Sim. Tenho pena dos miúdos. Tão permeáveis, tão influenciáveis, e nunca houve época tão fértil em estímulos, com a tv por cabo, a internet, os smartphones, as redes sociais e tanta gente que se demite da responsabilidade de ser uma influência positiva, um mentor, um guia, um disciplinador. Logo hoje em dia, quando tal é mais necessário que nunca.
Porque se a programação da tv é medíocre de tão violenta, gráfica, sexual, ignorante, há que direccionar a energia dos miúdos para bons livros, desporto, artes.
Se vivemos na época das redes sociais, selfies e milhares de sms por semana, há que redobrar a vigilância, garantir que não há cá perfis com fotos ridículas a fazer boquinha, de pose em roupa interior em frente ao espelho, saber quem são os amigos, os contactos. Que o acesso à internet deve ser vigiado. Que não há qualquer desculpa para menores de 16 serem notícia por se embriagarem no Bairro Alto.
Que até lá continuaremos a ler notícias de maus comportamentos juvenis que nos chocam, não só pelo teor, mas também porque nos lembram que, no que toca às gerações futuras, chumbámos.