quinta-feira, 31 de março de 2016

coisas que recomendo: Em defesa dos arneses para crianças.



Há muitos anos atrás, era eu uma miúda de 17 /18 anos, e tinha o primeiro part-time no shopping que conciliava com as aulas de Alemão. O mundo naquela época parecia de certa forma um lugar mais seguro, mais cor-de-rosa que hoje. Em parte certamente porque não havia, como hoje, serviços noticiosos 24 horas por dia a bombardearem-nos constantemente com um léxico de horrores. Não é que as coisas não ocorressem, mas como diz o ditado "a ignorância é uma bênção." Ou simplesmente parece ser.
Por exemplo, acho que o termo "pedofilia" nunca me tinha passado pelo pensamento até ao boom mediático do caso Casa Pia, assim como o caso "Rui Pedro" se tornou um triste ícone da matéria sobre o desaparecimento de crianças. Isto, anos depois do evento que vos relato.

Uma calma manhã saio da loja para ir ao wc. Apressada, como de costume, porque convinha não demorar e queria aproveitar para também fumar um cigarro. Naquele layout particular o wc das mulheres estava mais recuado, e tínhamos sempre que passar ao lado do lavabo masculino. Enquanto ia perdida nos meus pensamentos, ocorreu, por um simples acaso, olhar para o lado durante uns segundos no momento em que passava pela porta do wc masculino. A minha vista trespassou a vidraça da vigia que enfeitava a porta e pareceu-me vislumbrar algo muito estranho.
Pareceu-me ver um adulto a cortar o cabelo a um miúdo junto dos lavatórios. A cena pareceu-me tão bizarra, tão fora do comum, que o meu cérebro teve sérias dificuldades em assimilar a coisa.

Pelo sim, pelo não, dirigi-me a um dos seguranças e descrevi-lhe o que me pareceu ter visto. Que por ser tão estranho e ter sido tão rápido, não tinha certezas absolutas mas, que preferia pecar por excesso de zelo. O segurança disse-me ter tomado a melhor opção e que voltasse à minha rotina, que eles tratariam de tudo a partir daquele momento.
Nunca soube o desfecho da história, mas é coisa que nunca mais esqueci. E que voltei a recordar de cada vez que uma criança figurava uma qualquer triste notícia.

Serve este prêambulo para nada mais que ilustrar que o perigo existe, independentemente da nossa consciência sobre tal. Não é para andarmos paranóicos, apenas conscientes do que existe um pouco por todo o lado.

Mas, hoje estou aqui para falar sobre as chamadas "trelas" para crianças. Ou melhor, para partilhar a minha perspectiva, que vem em defesa deste artefacto ainda tão criticado e incompreendido.
Para estruturar melhor o meu argumento, googlei "trelas para crianças". Fui dar a alguns blogues, (aqui e aqui), e fóruns, (como aqui e aqui).
Como em tudo as opiniões dividem-se.

A amostra constituída pelas opiniões nos links citados é um bom exemplo disto mesmo. Há quem defenda os arneses porque em criança usaram um e acharam a experiência tão positiva que agora os procuram para os filhos, ou porque já apanharam cagaços valentes e passaram a olhar para este acessório como um adjuvante para evitar situações futuras, ou ainda porque estão ou estiveram num qualquer país onde o uso deste é comum e isso bastou-lhes para não olharem para o dito com estranheza e preconceito, chegando mesmo a ver o lado prático da coisa.

Se este post tivesse um objectivo seria esse mesmo: adoraria que as pessoas olhassem para estes acessórios como sendo isso mesmo - um acessório - com a mesma naturalidade com que olham para qualquer outro, sejam as fraldas descartáveis, os ovos, tudo o resto. E sem preconceitos possam deliberar se, no seu caso, lhes é ou não útil. Tão simples quanto isso. Também houve um tempo em que se achou que as papas já preparadas e os boiões eram coisas para mães preguiçosas. Ainda há pouco tempo se olhavam para os marsupiais e slings com alguma estranheza.  Felizmente o mundo evolui: "Primeiro estranha-se, depois entranha-se".

Na amostra supra citada há quem não adira às chamadas "trelas" por isso mesmo, por acharem que no seu caso não lhes serviria de muito. E depois há aquelas opiniões que perdoem-me mas tenho que confessar que me tiram do sério pois demonstram uma ignorância, umas vistas curtas, umas palas nos olhos de todo o tamanho. São as pessoas que optam por "argumentar" afirmando que quem recorre a um acessório destes trata as crianças como cães, (infelizmente, quem dera a muitas crianças por este mundo fora terem a sorte de serem tão bem tratadas como alguns cães!), é preguiçoso, é mau progenitor e não devia ter filhos.
Infelizmente, este tipo de vozes com as suas opiniões carregadas de preconceito, julgamento e ignorância são capazes de influenciar um terceiro grupo de pais, que gostariam de experimentar o produto mas não o fazem por vergonha, porque não querem ser olhados de lado, nem serem alvos de comentários maldosos. O mais triste é que assim, pelos piores motivos, abdicam de fazer algo que aumentaria a segurança dos filhos, a sua tranquilidade e até lhes facilitaria um pouco a vida.

Confesso que os comentários onde se apelidou de preguiçosos e incapazes os pais que usam os arneses me ficaram na memória. A passearem tranquilos com a criança pela trela, como se atrevem, não é?! Como se tranquilidade e parentalidade não combinassem, como se fosse um pecado unir esses dois conceitos. Se não vos causa dor e sofrimento então é porque não estão a fazê-lo bem. Será isso?
Honestamente apetecia-me dizer-lhes "Ai é assim? Então toca a passar para cá tudo o que foi inventado para facilitar a vida aos pais! Fraldas descartáveis, toalhitas, biberões, carrinhos de bébé, tudo!"
Aliás, ao que estas pessoas chamam preguiça eu chamo inteligência. Sem esta não teríamos inúmeros confortos na nossa vida quotidiana, aos quais já nem damos o devido valor, como água potável a sair da torneira, luz ao clicar num interruptor, frigoríficos para preservar os alimentos entre tantos e tantos outros.


Porque defendo os arneses?

1º - Pela saúde das crianças:
Já ouviram falar em luxação do cotovelo ou cotovelo de ama?

2º - Pela saúde dos adultos:
Claro que é agradável andar de mão dada com as crianças, ou ampará-las enquanto dão os seus primeiros passos. No entanto acho que ninguém achará confortável fazê-lo durante longos períodos, porque nos obriga a andar tortos e curvados, com implicações óbvias para a coluna. Acho que este acessório aumenta o conforto físico de pais e avós.

3º - Explorar com segurança:
Há quem ache que as crianças fiquem demasiado restringidas quando estão com o peitoral. Eu defendo precisamente o contrário. Acho que tê-las pela mão ou no carrinho lhes diminui muito mais a liberdade. Com o peitoral, podem andar por si, explorar, ter uma certa sensação de autonomia, mas sem perigos porque estão sempre ligados ao adulto.

4º - Mais tranquilidade, menos zangas, mais diálogo:
Utilizar o arnês não implica que não se ensine à criança todas as regras de segurança, inclusive aquelas sobre como se deve circular em todos os tipos de espaços, desde como deve ter cuidado com os carros, etc.
O que acontece, na minha opinião, é que estando sempre a criança em segurança quando está a usar este acessório, os pais não andam naquele estado de frustração porque o sacana do miúdo lhes pregou 20 sustos na última hora, nem têm que andar aos berros porque este teima em afastar-se, nem recorrer à palmada.
São totalmente livres de discordar, mas eu cá acho fantástico não se ter que andar a berrar advertências de 2 em 2 minutos, nem andar sempre em stress ou a correr atrás deles, e com isso poder aproveitar as saídas para explicar tudo o que se queira que eles aprendam com calma e tranquilidade.

5º - Ninguém é infalível:
Porque as crianças são como são, até os pais ou os avós mais atentos apanharão, pelo menos uma vez na vida, um daqueles sustos. Não por falta de zelo, mas porque realmente bastam dois segundos. Sabem aqueles dois segundos que demora a abrir a carteira para sacar do cartão para pagar as compras no supermercado? Os mesmos dois segundos em que olhamos para os produtos expostos nos lineares, ou que gastamos num breve cumprimento a quem se cruza connosco, ou que sacamos do telemóvel para ver quem nos está a ligar...
Nós não somos máquinas.

6º - Porque, para além de seguro, é prático:
Não defendo que o arnês seja usado em todos os momentos. Há ocasiões específicas em que este é desnecessário. Que não se deve abusar pois é um acessório de segurança, um elo de ligação, e não um castigo.
Há ocasiões em que o acho indispensável como idas a shoppings, aeroportos, visitas a sítios a transbordar de gente (imaginem a Eurodisney, por exemplo), saídas em que só está presente um dos adultos, momentos em que terão que desviar as atenções para outra coisa que não a criança, etc.

Todos os dias vejo inúmeras mães a saírem com as suas crianças pela mão. Há muito para fazer e tratar. São poucas as pausas. Se se sentam para tomar um café, é certinho que se levantarão dezenas de vezes para agarrar os petizes irrequietos. Voltam a casa de mãos carregadas. Não há braços para tudo. Tentam controlar a marcha dos miúdos com advertências. Não é assim tão raro o dia em que a criança chegue a casa já num pranto. Houve algures no caminho uma pausa para uma palmada. Muito provavelmente porque o petiz decidiu correr na direcção da estrada. Olho para as inúmeras mães e parecem exaustas ainda nem é hora de almoço. Chegam curvadas e tortas. Tiveram que arranjar maneira de libertar uma mão para virem de mão dada, por segurança, e por isso carregam um incontável número de sacos numa só mão. E eu penso: "Mas se podia ser tão mais fácil e seguro..."

7º - Porque não são trelas, nem se parecem com estas:
Existem vários modelos. Desde os arneses, às mochilas com peluches de onde sai a tal correia que os liga aos adultos, até a duas pulseiras ligadas entre si, até modelos que servem para apoiar nos primeiros passos e mais... Basta googlar e encontrarão imensos exemplos. Escolhi apenas alguns para ilustrar.













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